Recebimento: 15/09/2025 13:30:53 |
Fase: Emitir Parecer da Procuradoria sobre Projeto de Lei |
Setor:Procuradoria |
Envio: 22/09/2025 16:03:01 |
Ação: Parecer da Procuradoria Emitido
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Tempo gasto: 7 dias, 2 horas, 32 minutos
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Complemento da Ação: PROCURADORIA
PROJETO DE LEI Nº 150/2025
Processo nº 14488/2025
PARECER
“PROJETO DE LEI – PL. OBRIGATORIEDADE DE DISPONIBILIZAR CADEIRA DE RODAS NAS ESCOLAS PÚBLICAS E PRIVADAS DO MUNICÍPIO DE LINHARES. VIABILIDADE CONDICIONADA.”
Pelo presente PL as escolas públicas e privadas do Município de Linhares ficam obrigadas a disponibilizar cadeira de rodas em local de fácil acesso em suas dependências, destinada ao deslocamento de pessoa com deficiência ou pessoa que estiver temporariamente impossibilitada de caminhar.
Consta na justificativa que acompanha o PL que o objetivo é garantir a acessibilidade e inclusão de alunos com deficiência, mobilidade reduzida ou que estiver temporariamente impedida de caminhar. Visa, também, proporcionar que estas pessoas participem plenamente das atividades escolares, garantindo acesso igualitário a todos os espaços da escola.
Pois bem.
Quanto aos aspectos jurídicos, vale registrar, inicialmente, que a proposta legislativa encontra respaldo constitucional, notadamente no art. 30, I e II, da CF/88, que prevê a competência do município para suplementar a legislação federal e estadual, bem como para legislar acerca do interesse local.
Além disso, o art. 24, XII, da CF/88, define a competência concorrente dos entes públicos para legislar sobre: “proteção e defesa da saúde, proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência; e a proteção à infância e à juventude.”
O objeto do Projeto de Lei – disponibilização de cadeira de rodas em local de fácil nas escolas públicas e privadas do Município de Linhares – insere-se de forma clara e inquestionável no âmbito das áreas acima especificadas, garantido a competência municipal para legislar sobre o tema.
Ressalte-se que a matéria que está sendo proposta já foi aprovada em outros municípios, tendo inclusive sido objeto de Ação Direita de Inconstitucionalidade (que foi julgada improcedente), conforme se verifica abaixo:
DIREITO CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ACESSIBILIDADE. IMPROCEDÊNCIA. I. Caso em Exame 1. Ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Prefeito do Município de Tietê contra a Lei Municipal nº 3.998/2024, que obriga a disponibilização de cadeiras de rodas em escolas e repartições públicas do município. Alegação de vício de iniciativa e violação do princípio da separação de poderes, além de criação de despesas sem fonte de custeio. II. Questão em Discussão 2. A questão em discussão consiste em determinar se a Lei Municipal nº 3.998/2024 viola a Constituição do Estado de São Paulo ao impor obrigações ao Poder Executivo Municipal sem a devida iniciativa e fonte de custeio. III. Razões de Decidir 3. A lei visa assegurar acessibilidade e inclusão social, em conformidade com a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência e o Estatuto da Pessoa com Deficiência. 4. Não há vício de iniciativa, pois a matéria de acessibilidade é de iniciativa comum e não exclusiva do Poder Executivo. A lei não interfere na estrutura administrativa ou na gestão de despesas. IV. Dispositivo e Tese 5. Ação julgada improcedente. Tese de julgamento: 1. A legislação municipal que visa assegurar direitos fundamentais, como a acessibilidade, não usurpa competência privativa do Poder Executivo. 2. A criação de despesas sem interferir na estrutura administrativa não configura vício de iniciativa. Legislação Citada: Constituição do Estado de São Paulo, arts. 5º, 25, 47, II e XIV, 176, II, 144. Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Jurisprudência Citada: STF, ADI 472, Rel. Min. Edson Fachin, 22/06/2020. STF, Tema 917, Repercussão Geral. TJSP, Direta de Inconstitucionalidade 2087669-23.2024.8.26.0000, Rel. Marcia Dalla Déa Barone, Órgão Especial, j. 03/07/2024. TJSP, Direta de Inconstitucionalidade 2111837-65.2019.8.26.0000, Rel. Evaristo dos Santos, Órgão Especial, j. 11/09/2019. (Grifo nosso)
Quanto ao mérito do PL, nota-se que a obrigatoriedade que está sendo criada se estende tanto a instituições públicas quanto privadas.
Em relação às escolas públicas, embora o cumprimento possa, de fato, gerar custos, deve-se entender que a medida não versa sobre a criação, extinção ou aumento de cargos, funções ou empregos públicos, nem sobre a estrutura administrativa do Poder Executivo ou o regime jurídico de seus servidores.
A despesa gerada para o Executivo municipal, no que tange às escolas públicas, é uma consequência indireta e natural da adequação a uma norma de interesse público, e não o objeto principal ou direto da lei.
Vale lembrar que o Supremo Tribunal Federal (STF) tem entendimento consolidado de que vereadores podem propor projetos de lei que resultem em despesas para o Executivo, desde que não interfiram nas atribuições privativas do Prefeito, como a organização administrativa e a criação de cargos públicos. Portanto, o PL se mostra regular.
No que toca às instituições privadas, a Constituição Federal assegura a livre iniciativa e a livre concorrência como princípios fundamentais da ordem econômica (Art. 170, caput e incisos IV e V). Contudo, é cediço que tais princípios não são absolutos e podem ser relativizados em face do interesse público e da função social da propriedade e da empresa.
No presente caso, a exigência para escolas privadas visa à proteção e defesa da saúde, a proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência, e a proteção à infância e à juventude, que são bens jurídicos de relevantíssimo interesse público e constitucionalmente protegidos. Embora a assistência à saúde seja livre à iniciativa privada (Art. 199, CF), esta pode ser regulamentada e fiscalizada pelo Estado, principalmente quando se trata de proteção de direitos fundamentais.
A imposição da obrigatoriedade aos estabelecimentos privados, portanto, não extrapola a atuação do poder público na ordem econômica e financeira. Trata-se de um legítimo exercício do poder de polícia do Município em prol do interesse público relevante, pautado pela razoabilidade e proporcionalidade.
Passados esses pontos, deve ser dada uma atenção especial ao art. 2º do Projeto de Lei em exame. Este é, sem dúvida, o ponto mais crítico e de maior fragilidade jurídica do Projeto de Lei em sua redação atual.
O Art. 2º do PL estabelece: "Art. 2º O descumprimento da presente Lei pelos estabelecimentos privados implicará em:"
O dispositivo prevê a aplicação de penalidade apenas para as instituições privadas. Ora, se a lei impõe uma obrigação a " escolas públicas e privadas", é fundamental que as consequências do descumprimento também abranjam ambos, em nome da isonomia e coerência normativa.
Certo é que as penalidades para órgãos públicos se manifestam de forma diferente (por exemplo, pode ser previsto responsabilização dos agentes públicos, medias administrativas internas, dentre outras), mas a lei deve prever que o estabelecimento público também está sujeito às consequências do descumprimento.
Diante disso, recomenda-se a alteração do art. 2º, a fim de preservar a total constitucionalidade do PL.
Quanto à técnica legislativa, verifica-se que o PL atende ao estabelecido na Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, a qual dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, estando os dispositivos bem articulados a corretamente padronizados.
Ademais, a redação do Projeto de Lei que se pretende aprovar é suficientemente clara e de fácil compreensão.
Destarte, a PROCURADORIA da Câmara Municipal de Linhares, após análise e apreciação do Projeto em destaque, OPINA pela VIABILIDADE CONDICIONADA do PL, devendo ser dada especial atenção ao art. 2º.
Por fim, as deliberações do Plenário no que tange ao projeto de lei em questão deverão ser por MAIORIA SIMPLES dos membros da Câmara, e quanto à votação, esta deverá ser SIMBÓLICA, tendo em vista que o Regimento Interno da Câmara Municipal não exige quórum especial nem processo de votação diferenciado para aprovação da matéria em questão.
Em tempo, na forma prevista pelo parágrafo único do art. 69 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Linhares, o presente Projeto de Lei deverá tramitar pela Comissão de Constituição e Justiça, bem como ter seu mérito analisado pela Comissão de Educação, Cultura, Turismo, Esporte, Saúde, Assistência Social, Segurança, Obras e Meio Ambiente, em razão de sua atribuição regimental para se manifestar sobre as matérias relacionadas à saúde, assistência sanitária, cidadania e direitos do consumidor.
O PL deverá ter seu mérito analisado, igualmente, pela Comissão de Defesa e Promoção dos Direitos da Mulher, do Negro, da Pessoa Idosa, da Criança e do Adolescente, da Pessoa com Deficiência, da Família, e dos Direitos Humanos, em razão da clara relação da matéria com suas competências regimentais.
É o parecer, salvo melhor Juízo de Vossas Excelências.
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Documento(s) da tramitação:
Despacho Digital
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